sábado, 2 de abril de 2011

Crescimento dos verdes provoca mudança "sísmica" no cenário político alemão

Der Spiegel 
Charles Hawley

Alguns talvez argumentem que o sucesso do Partido Verde nas eleições estaduais de domingo (27) foram o resultado direto do desastre nuclear de Fukushima. Mas não foram. O cenário político alemão mudou dramaticamente nos últimos anos. E os verdes foram os principais beneficiários.



A equação parece simples. O desastre nuclear no Japão combinado com o amplo questionamento da energia atômica na Alemanha resulta em um sucesso eleitoral recorde para o Partido Verde, que é contra usinas nucleares, em duas eleições estaduais no domingo.

Essa linha de raciocínio certamente é tentadora. A Alemanha, afinal, tem reagido com preocupação notável à atual calamidade na instalação nuclear de Fukushima na costa Leste do Japão. E a resultante mudança radical na política nuclear do governo da chanceler Angela Merkel em Berlim pode parecer qualquer coisa, menos fria e calculada.

Mas os verdes da Alemanha vinham crescendo por meses antes dos eventos no Japão. Em muitos Estados, o partido está ombro a ombro com os cristãos democratas (CDU) de Merkel e os sociais democratas (SPD). Em muitos outros, seus números também estão subindo.De fato, longe de ser um evento isolado, o resultado de 24,2% do partido em Baden-Württemberg e de 15,4% na Renânia-Palatinado no domingo marcam o início de uma nova era no cenário político da Alemanha. Os verdes se beneficiaram grandemente da atual exasperação com os partidos tradicionais, CDU e SPD –e os ambientalistas, outrora rebeldes, agora se tornaram parte do centro político do país.

“Nos debates culturais que foram travados nos últimos anos, focados em questões de estilo de vida, questões de valores ou energia nucelar, o centro-esquerda e os verdes tiveram o apoio do novo núcleo da sociedade”, escreveu o analista político Franz Walter no “Spiegel Online” na segunda-feira. “Culturalmente, o novo centro da sociedade distanciou-se passo a passo dos cristãos democratas e da visão de mundo tradicional conservadora.”

Amadurecidos depois de suas origens turbulentas
O sucesso no final de semana em Baden-Württenberg de muitas formas foi sintomático dessa tendência. Eleitores no Estado têm questionado profundamente o projeto de renovação urbana de vários bilhões de euros chamado Stuttgart 21. Os protestos têm sido duros, enquanto muitos acusam o governo de pouca transparência. Os verdes, que se opuseram ao projeto desde o primeiro dia, conquistaram muitos partidários.

Domingo, contudo, também ressaltou uma das principais razões para os avanços do Partido Verde nos últimos anos. Mesmo que o eleitorado pareça estar gravitando para a centro-esquerda, os próprios verdes amadureceram significativamente desde suas origens turbulentas.

O ex-ministro de relações exteriores Joschka Fischer personifica os antigos verdes. Em 1985, Fischer, com 37 anos, tomou posse como ministro do meio ambiente para o Estado de Hesse –vestindo um paletó maltrapilho e um par de tênis. Dois anos antes, como membro do contingente do Partido Verde no Parlamento, Fischer chegou às manchetes insultando o presidente da Casa Richard Stücklen. “Com licença, mas o senhor é um idiota”, disse Fischer a Stücklen durante um debate no plenário.

Por outro lado, Winfried Kretschmann, que deve se tornar governador de Baden-Württenberg como líder de uma coalizão com o SPD, tem 62 anos, é ex-professor de biologia, canta no coro da igreja local e pertence ao clube de tiro da aldeia. Seu passatempo favorito é caminhar nos morros de Schwäbische Alb com sua mulher. Em vez de discursos políticos ferozes, Kretschmann prefere a seriedade intelectual –a pressão sanguínea tende a cair mais rápido do que subir quando ele sobe ao pódio.“Vamos celebrar e nos divertir hoje”, disse ele no domingo à noite com os resultados. “Mas amanhã, voltaremos ao trabalho”.Os verdes, é claro, já tiveram sucesso no passado. De 1998 a 2005, o partido foi parceiro júnior da coalizão do chanceler Gerhard Schröder, sob a liderança de Fischer. O partido também participou de vários governos estaduais. Baden-Württemberg, contudo, marca a primeira vez que um governador estadual virá do Partido Verde. E se olharmos com mais cuidado os resultados de domingo, veremos que talvez não seja a última.

O pior resultado de todos os tempos
Nos últimos anos, os eleitores na Alemanha têm sido inconstantes e vêm dando as costas para os partidos tradicionais do país. Apesar do foco de segunda-feira ter sido no resultado historicamente pobre do CDU em Baden-Württemberg, o resultado do SPD não foi melhor. Os 23% do partido foram o pior resultado de todos os tempos. Na Renânia-Palatinado, o governador Kurt Beck do SPD mal conseguiu segurar o CDU e perdeu 11 pontos percentuais em relação a 2006.

É a continuação de uma tendência. Em eleição após eleição, ou o SPD ou o CDU ou ambos, como no caso de Hesse em 2009, tiveram votação excepcionalmente baixa. Os dois partidos, mas particularmente os sociais democratas, tiveram queda de número de membros nos últimos anos.

Partidos menores, como os democratas livres, o Partido da Esquerda e os verdes, foram ocupando os espaços. Mas agora, com o Partido da Esquerda empacado (não conseguiu superar a obstáculo de 5% para representação parlamentar nas duas votações estaduais de domingo), e os democratas livres (FDP), partido voltado para interesses empresariais, em queda livre (5,3% em Baden-Württemberg; 4,2% em Renânia-Palatinado), os verdes, ao que parece, são o único partido alternativo que restou.

Stefan Mappus, governador do CDU de Baden-Württemberg que está deixando o cargo esforçou-se para apresentar os resultados das eleições em seu Estado como um evento único. “Há uma semana, as pesquisas davam 42% ao CDU e 7% para o FDP”, disse quando chegaram os resultados. “Mas então ocorreram os eventos terríveis no Japão”. Outros apontaram para a abstenção da Alemanha na votação no Conselho de Segurança da ONU sobre a Líbia, que se provou particularmente prejudicial para o partido do ministro de relações exteriores, Guido Westerwelle, o FDP.

As pesquisas, porém, já vinham apontando para a ascensão de Kretschmann há meses, muito antes de Fukushima e da Líbia. A votação impressionante na Renânia-Palatinado também foi prevista por todas as pesquisas. De fato, o partido pode acabar conseguindo uma segunda eleição estadual em setembro, quando os eleitores da cidade-estado de Berlim forem às urnas.

Em suma, o cenário político do país passou por uma mudança profunda no final de semana. A Alemanha não é mais um país firmemente nas mãos do SPD e CDU. A partir de domingo, os verdes penetraram na festa. E em breve, talvez estejam enviando convites.

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